OS POETAS DO TIETÊ - 1° CARAVANA DA POESIA
Dentro do “buzão”, a alegria estava tomando conta, muitos poetas estavam indo ao Rio de Janeiro pela primeira vez e ainda por cima, para recitar poesias. Entre batuques de pandeiros e versos de samba, rap e (“ninguém vai nanar”) a viagem foi embalada pela madrugada adentro. Chegamos ao RJ e pegamos logo um engarrafamento monstro na Rodovia Presidente Dutra, conseguimos chegar ao SESC Ramos, onde fomos recepcionados, por volta das dez da manhã, a viagem foi longuíssima e cansativa, mas, todos estavam animados para a aventura poética na cidade. Tomamos café da manhã no SESC Ramos, almoçamos e relaxamos um pouco antes da partida para o primeiro sarau - Complexo do Alemão.
O ônibus partiu para o Complexo do Alemão, precisamente na Grota, uma das comunidades do local, o Buzo gravou a nossa chegada para o programa Manos e Minas da TV Cultura, desembarcamos na comunidade e logo de cara vimos as cenas que até então, só tínhamos visto pela TV, soldados armados de fuzis e metralhadoras, tropa de elite, caminhões de guerra, circulando pelas vias, o momento foi de tensão, mas, sabíamos que nada iria abalar a nossa vibe positiva. Seguimos até o local onde rolou o sarau, era um evento da comunidade chamado Circulando, sétimo ano que rola esse evento por lá. Os poetas foram anunciados pelos microfones e logo estávamos todos unidos, poetas-comunidade, na mesma sintonia. O Sarau começou com os tambores do Sarau da Brasa chamando os poetas, vários poetas se apresentaram, nesse meio tempo, os Poetas do Tietê foram até uma parte da comunidade gravar os vídeopoemas para exibição no blog, enquanto o sarau pegava fogo na outra parte do evento. Tudo correu bem, sem problemas algum, a receptividade da comunidade foi na paz, saímos do complexo do alemão por volta das cinco e tantas da tarde em direção a comunidade Fallet em Sta. Teresa.
Dentro do buzão indo em direção a Sta. Teresa, víamos da janela a beleza e a pobreza da cidade, uns pontos lindos, outros nada agradáveis do RJ, chegamos em Sta. Teresa por volta das seis e meia da noite, desembarcamos em um ponto onde tinham vários casarões antigos, ruas de paralelepípedos, bairro bem arborizado e bonito, logo pensamos que iríamos recitar naquele lugar amistoso, puro engano. Começamos a caminhar pelo bairro, subindo e descendo ladeiras, entrando por vielas e escadarias, logo a face da comunidade foi revelando-se para os poetas. Homens armados com pistolas e fuzis nos fitando, o tráfico imperando nas ruas, a pobreza de alguns a riqueza de outros e a tensão tomou conta de todos que ali estavam, sem exceção. Fomos chegando próximo ao local onde estava acontecendo um evento organizado pela comunidade, a cena foi de susto, bandidos armados faziam a segurança próximo ao local, uma fotografa que nos acompanhava, retirou a câmera da bolsa e logo foi repreendida por um dos traficantes, dizendo que não podia filmar nem fotografar e isso a base de gritos, a moça ficou em pânico e começou a chorar, o escritor Julio Ludemir que estava nos acompanhando e conhece a comunidade, foi conversar com o traficante para amenizar a situação. Subimos para o local do sarau que correu bem, apesar da tensão que rondava por ali, ao final do sarau, fomos convidados a comer um enorme bolo (e por sinal uma delícia!) que a comunidade havia preparado para o evento. Logo chegou a hora de parti já eram quase dez da noite, teríamos que subir ladeiras e escadarias novamente, poucos estavam dispostos, um dos traficantes que estava mais enturmado com os poetas, fez questão de ir buscar o ônibus para que não fizéssemos aquela romaria toda da subida, mais, não teve jeito, o ônibus não entrava naquelas vielas apertadas da comunidade, subimos a base da “canela” e chegamos ao buzão, suados, cansados e felizes por tudo ter corrido bem. Partimos então, para o terceiro sarau do dia no Morro Agudo em Nova Iguaçu, Baixada Fluminense.
Embarcamos e o ônibus partiu para Nova Iguaçu no Enraizados, uns cansados, outros ainda com as baterias carregadas, porém, ninguém desanimado, ainda estávamos no clima de adrenalina ocorrido no último sarau na comunidade Fallet. Chegamos ao local, centro de cultura do Enraizados por volta das meia noite e meia, e no local já estava rolando um evento com música e foi só os poetas chegarem que a animação tomou conta de todos, assistimos as apresentações de free style do MCs do projeto Enraizados, muito bom por sinal, tinha um menino de onze anos que mandou muito bem no free style. Após a apresentação dos MC’s, começou o nosso sarau com a abertura do sarau da brasa com os tambores chamando os poetas para recitarem, tudo na maior paz e alegria, todos os poetas visivelmente cansados fizeram um recital muito louco, mandaram bem em todos os poemas, encerramos com os tambores da brasa a noite de poesia, mais ainda rolou uma batalha de MC’s na brincadeira com os poetas e os meninos do projeto Enraizados, a noite só estava esquentando, um churrasco e muita cerveja ainda estava para sair, enfim, lembro que fui dormir por volta das cinco da matina, embriagado e com a garganta ruim de cantar e as mãos doendo de tocar atabaque.
Despertamos logo cedo numa manhã de domingo quente a beça, para nos organizar para ir à praia, de inicio a dúvida de qual praia ir, mais, a maioria venceu, iríamos a Ipanema, o buzão encostou por volta das onze da manhã, embarcamos de mala e cuia, pois, era nosso último dia no RJ, fomos a Ipanema, chegando no local de desembarque, logo todo mundo se espalhou, os Poetas do Tietê foram até Copacabana onde gravou-se um Videopoema na estátua do Drummond, que fica à beira da praia, e curtimos o Arpoador e Ipanema também. Tudo muito bom, tudo muito bem, mas, ainda teríamos o último compromisso no morro do Borel, último sarau da Caravana da poesia, embarcamos no buzão por volta das seis da tarde e partimos para o Borel.
Chegamos na comunidade por volta das sete da noite, desembarcamos em frente a um SESC, e pegamos umas kombis que é o transporte tradicional de quem sobe o morro, pois, o ônibus que estávamos não entrava nas ruas estreitas da comunidade, tampouco, subiria aquele morro imenso, a vista lá de cima era maravilhosa, dava para ver o RJ inteiro, muito lindo mesmo, o lugar não poderia se chamar outro – Chácara do Céu- onde desembarcamos na casa do Sr. Gabeira, líder comunitário, haviam duas placas que anunciavam “Rajadas Poéticas: Os Poetas estão chegando” no terraço da casa, sua esposa e família nos recepcionaram com uma galinhada (uma delícia!) para matar a fome dos famintos poetas, comemos bastante e depois ainda rolou uma sobremesa para fechar o banquete, subimos a laje da casa do Sr. Gabeira para admirar aquela paisagem deslumbrante do RJ é a melhor digestão que existe, comer e olhar a paisagem. Hora do último sarau, fomos para o local, uma antiga igreja, próximo a uma UPP (unidade de polícia pacificadora) da comunidade, fomos nos organizando e chamando a criançada toda para participar, alguns minutos depois, a comunidade já estava nos aguardando começar o sarau. Foi demais, a comunidade aplaudia cada um dos poetas que se apresentaram como se fosse o primeiro sarau da caravana, um dos melhores que fizemos nos dois dias de caravana, e para encerrar o sarau, fizemos uma ciranda com todos os presentes, as crianças adoraram. Nos despedimos de todos por volta das onze da noite, felizes, com a sensação do dever muito bem cumprido. Embarcamos nas Kombis e fomos em direção ao ônibus, embarcamos no “buzão” e hibernamos, não se ouvia um ruído de vozes, pandeiros ou outra coisa qualquer, só os roncos e respirações dos poetas fadigados. Por volta das três da madrugada, acordamos com o ônibus balançando e um barulho, o pneu do buzão havia estourado, um detalhe que não poderia faltar na aventura, toda caravana tem o seu perrengue, o motoristas e alguns dispostos desceram para trocar o pneu, depois de uns quarenta minutos, estávamos de volta a estrada. Chegamos em SP por volta das sete e meia da manhã da segunda feira, dia 20, cansados e felizes, com um gostinho de quero mais, fechando o ano com chave de ouro... olhei para trás e vi os poetas com suas malas voltando para suas casas e vidas reais.
Caranguejúnior
OS POETAS DO TIETÊ - I CARAVANA DA POESIA
Organizado pela Poiesis junto com o escritor, apresentador e cineasta Alessandro Buzo, a I caravana da poesia vai contar com um buzão com 40 e tantos poetas de diversos sarais de São Paulo como: Brasa, Fundão, Elo da Corrente, Ademar, Suburbano e Binho, e os Poetas do Tietê foram convidados por Marco Pezão, Coordenador da Poiesis para participarem dessa jornada poética de 2 dias na Cidade Maravilhosa, abaixo os locais por onde a I Caravana da Poesia irá passar:
Sábado 18/12
14h - Complexo do Alemão
19h - Comunidade Fallet (Sta. Teresa)
22h - ENRAIZADOS (Nova Iguaçu, Baixada)
Domingo 19/12
Manhã e tarde (PRAIA)
18h - Ultimo Sarau no "Salgueiro"
Fonte dos locais: http://buzo10.blogspot.com/
Na volta postamos as fotos aqui.
Poemanônimo
pedra fundamental
No mês de outubro comemora-se o aniversário de Drummond, e os Poetas do Tietê publicam suas variações sobre o tema "tinha uma pedra no meio do caminho".
NO MEIO DA INFÂNCIA
fernanda migliore
No meio da infância
estava a pedra,
novas matemáticas
outros jogos.
Mestres demais
ou fim da festa?
De repente,
nem dez brigadeiros me bastavam
nenhuma bola me rolava colorida
e os vestidos da menina eram
curtos pra mulher.
De repente - um só jogo:
Pula, pula, pula pedra!
No meio da infância
estava a pedra.
No meio do caminho,
do destino,
rola bola
pula pedra
brinca, brinca de pular.
PEDRAS DE DRUMMOND
marcelo tadeu
Ao Ler o Poema
Fiquei Imaginando
Ao viver, encontrei as pedras
Então, as tirei do meu caminho
E fui embora
Doce Ilusão
Aparecerem pedras novas
NO MEIO
caranguejúnior
I
No meio da pedra
tinha um caminho,
e foi por lá
que passei.
II
No meio da sala
tinha uma TV
e uma criança pálida
perdendo seu tempo
III
No meio da rua
pode-se encontrar
pedra, pó, erva...
e várias pessoas
sem esperança.
IV
No meio das ideias
Tinha um maracatu,
Tinha um maracatu
No meio das ideias
Então, não deu
Pra escrever linhas tortas
Nem pra eu
Nem pra tu
Só o
Ma
Ra
Ca
Tu
V
No meio da selva
havia pedras
Na selva de pedra
haviam meios
E o garoto com seu cachimbo
não encontrou o tal bom começo
Se perdeu entre as pedra.
É o fim.
(no
meio
do
começo
tinha
um
fim)
PÉTREA
paulo d'auria
A pedra de Drummond
é a maior pedra da história da literatura,
dura, dura, tão dura de engolir
aos puristas da alta-cultura
Mas não se faz literatura sem pedras,
não se faz arte sem pedras,
principalmente não se faz artistas sem pedras.
Poeta de flores e amores somente
não é poeta por inteiro.
Subo na careca pétrea de Drummond
e avisto ao longe.
Até onde
vai o caminho
sem fim.
paulo d'auria
no meio da minha vida
falta um mar pacífico
no meio da minha tempestade de espírito
falta um mar atlântico
que me leve ao desconhecido
falta um mar
falta um mar
falta um mar
falta eu aprender
a nadar
andré dia(s/z)?
tinha um buraco,
Tinha um buraco
no meio do dente,
Tudo culpa da bala toffee
que arrancou a obturação:
Ai! Toffodido! Toffodido!
heterônimos do tietê
Maicon da Silva (andré dia(s/z)?) é engraxate, nasceu em 1982 em Capão Redondo. Pegou gosto pela poesia ao encontrar uma antologia de poetas em uma caçamba de construção, juntamente com centenas de livros escolares novinhos em folha, bem próximo a uma escola pública.
Tem o sonho de publicar um livro, mas antes pretende juntar um dinheirinho para poder comprar um terno e gravata, pois percebeu que colegas de profissão que se vestem melhor têm a preferência dos "doutor" na hora da engraxada.
O Pisante do Doutor
Eu engraxo
com gosto,
pois engraxar
é uma arte.
Lambuzo de graxa
o pisante do doutor,
que se acha importante,
me olha todo superior,
mas ele mesmo, coitado,
não sabe dar o brilho
que eu dou
nos sapatos que vão embora
pros lugares onde nunca
poderei entrar.
Eva Ruiz (paulo d'auria) é professora de geografia aposentada da rede pública estadual. Atualmanete ministra oficinas de cordel em bibliotecas municipais. Tem 65 anos, é divorciada, não tem filhos e mora sozinha. Já teve fantasias com suas alunas.
Só, neto
Passam-me as horas do dia
esperando por você,
passam sem nenhuma alegria
molhadas pela chuva fria.
E eu perscrutando os porquês
do amor, do desamor, das idas e vinda (vazias)
da primavera sem bouquets
do cinza no meio da vida
Mas viver não é isso apenas:
enquanto a vida foge,
eu a te escrever poemas?
Ou será mais? se for,
que seja sonho, delírio que me aloje
em tua cama, teus beijos, teu amor!
Seu Joaquim (marcelo tadeu) tem 55 anos e é auxiliar de limpeza.
O faxineiro
Um dia desses
Varrendo a calçada
Parei pra pensar,
Fiquei olhando os carros
As vitrines
As roupa e as pessoas
E observei:
Os meus sonhos para alguns
São tão comuns
Que fiquei assustado
Um pouco tonto e com medo,
Me sentei em uma cadeira
E perguntei ao amigo do lado,
- Será que tudo que passa
pela minha cabeça
é besteira...
José da Silva (caranguejúnior) é guardador de carros - flanelinha -, tem 37 anos e atualmente mora na Rua das Esquinas Quaisquer.
Viagem dos Sonhos
Não peguei o bonde
Que passou em direção à Felicidade
Fiquei aqui
Perdido nesta cidade
Esquecido
Meu trabalho de guardador
Quebra o galho durante o dia
Guardo a dor no coração
Guardá-la eu não queria
Como o pão
Que o diabo amassou
Leio as notícias
Do meu cobertor
Choro sozinho
Rio sozinho
E sozinho vivo
Conversando com a lua
Que me garoa
Esperto fico
Sonho com o dia
Em que o bonde retornará
E eu poderei embarcar
E seguir viagem
Reflexões sobre entrevista de Donizete Galvão
Neste sábado na Papoetaria, discutimos uma entrevista do poeta Donizete Galvão concedida a Andréa Catropa para o programa Ondas Literárias.
A partir dessa discussão, vários temas foram sugeridos para o nosso "Poema do Dia", entre eles, "Vida Besta", "A Poesia Como Antídoto da Morte" e o fato da poesia estar fora do mercado, ou seja, "A Poesia Não É Mercadoria".
Abaixo, nossa produção:
Planejamento (vida besta)
Caranguejúnior
Quatro horas da matina
acordar, tomar banho
trocar de roupa e sair
Quatro ônibus
e um trem...
Trabalhar, sufoco
suor na testa
cimento nos olhos
Quatro pessoas
conversa no almoço
Quatro garfadas
e um arroto
Quatro passos
trabalho, sufoco
Suor na testa
cimento nos olhos
Quatro para às seis
final do espediente
quatro pessoas
na parade de ônibus
Quatro ônibus
e um trem...
Quatro passos
para casa
tomar banho
trocar de roupa
e dormir... zzzz
Poesia Antídoto da Morte
Marcelo Tadeu
Sei que um dia
não estarei mais aqui
O meu corpo, minha alma
estarão em outro lugar
que não sei onde é,
Neste momento não quero discutir
sobre este segredo,
Só quero ressaltar
que minha memória
ficará aqui
para sempre
Poesia Não é Mercadoria
André Dia(s/z)?
Fui no mercado,
entre as embalagens
coloridas
não havia poesia,
Falaram que lá
não vende dessas
coisas não.
Chegando em casa
sentei no vaso
e das entranhas
tirei inspiração,
Escrevi versos
que os outros
chamam de merda,
Não sevem para vender
mas me alimentam
Carros de boi, carros de bestas
Paulo D'Auria
não é porque os automóveis não choram como choravam os carros de boi
não é porque a janela se abre para o muro e não para o coreto
não é porque o metrô itaquera anda mais a passo que a carroça de Odualdo
não é por nada
não é por tudo
que a vida besta deixa de girar como vespa
como mosca varejeira depositando seus bernes
na água parada dos cérebros estacionados
a tv ligada a tv desligada
não se passa nada
não é porque eu lembro que era melhor
não é porque anseio será melhor
não é por nada
não é por tudo
que eu vou esquecer
que a roda do mundo deixará de girar
vomitando estações
onde
não quero saltar
POEMAVERA
Caranguejúnior
SÉRIE SOBRE A DESPOLUIÇÃO DO RIO TIETÊ
Utilidade Pública dos Poetas do Tietê:
A Rádio Eldorado FM estreou uma série sobre a despoluição do Rio Tietê em seu Site.
Nesta semana, a Rádio Eldorado celebra vinte anos da campanha da despoluição do Rio Tietê. O projeto, inspirado na experiência inglesa com o Rio Tâmisa, mobilizou milhares de pessoas no inicio da década de 90 com intuito de se criar uma solução para a sujeira que toma o rio que corta o Estado de São Paulo. Após ampla adesão da população e de diversas entidades ligadas à preservação do meio ambiente, o governo do Estado criou em 1992 o “Projeto Tietê”, que agora chega à terceira etapa.
Para ler e ouvir mais sobre o assunto e se antenar neste problema que está embaixo e definitivamente dentro de nossos narizes, é só acessar o site da Radio Eldorado FM.
Caranguejúnior
Haiquasis III
Well Souza:
I
Grama artificial
não se apega
à natural
II
Casa vermelha
árvore vermelha
moça vermelha
Caranguejúnior:
I
Líbélula no orelhão
pessoas apressadas na calçada
vem e vão
II
Na mesa do bar
mãos no bolso
vento a soprar
II
Roseira na calçada
pára-raios a seu lado
a sorte está lançada
Paulo D'Auria
I
Céu cinza
flores vermelhas
inverno ainda
II
O vento sopra
o homem passa
sem deixar vestígios
André Dia(s/z)?
I
A palmeira balança ao vento
como um charuto trêmulo
na boca de um bêbado
II
A menina corre descalça
saliva em minha boca
inveja da sujeira em sua sola
Haiquasis II
I
leio na placa
que é proibido pisar na grama
então, simplesmente olho
II
minha cara na privada
a urina que cai
deforma meu reflexo
Paulo D'Auria:
I
o sol através
das verdes folhas,
amoras no pé
II
um salto
e o ipê amarelo
no preto asfalto
III
quase ilusão
duas estrelas no espelho do Tietê
uma se move, era avião
ah, o amor!
Marcelo Tadeu
Para quem não gosta de escrever sobre amor
Eu vos digo
Não tem como fugir
Ele se veste de várias formas
Se apresenta com várias máscaras
E no seu texto
Ele pode estar lá
Como outra palavra
Meu nome é bonde, perdi o bonde
Paulo D’Auria
passou o bonde
o trem
bala
passou o a
mór
por que não escrevo mais os velhos poemas de amor ou por outra
por que não me apaixono mais
perdia a capa-cidade de amar?
qual o sentido de se doar
em um mundo em que tudo se latro-sina?
e pra não dizer que não falei das flores
do bouquet de 1.000 rosas roubadas
poderia relembrar a primeira namorada mas
perdi o bonde
o trem
bala
perdido (n)a estação
qual poeta de folhetim
o poema de amor chega
ao fim
O amor
André Dia(s/z)?
O horror
de me prender
nessa cruz,
O amor.
Não! Não mais!
Tirem os pregos
dessas chagas!
Não mais sangue!
Não mais pus!
Não mais lágrimas!
Só o esperma,
o gozo da masturbação!
Santa Punheta
Do Amor-Próprio!
Não era amor, era...
Caranguejunior
Pensei que era
Meu amô
Senti que era
Seu amô
Quando me tocava
E me olhava
Em minha barriga acontecia
Uma revoada de borboletas
Pensei que era amô
Senti que já era!
Quando o médico diagnosticou:
Não era amô querida
Era lombriga...
O amor é foda
Caranguejunior
O amor sou eu
O amor é você
E eu
O amor somos nós
O amor é você perto
Eu longe
E nós juntos na cama
O amor é definitivamente foda
É foda!
poesia social
Trecho de "Quem matou Aparecida" de Ferreira Gullar
A poesia social de 2 Poetas do Tietê
Zé
Paulo D’Auria
é possível tirar alegria do homem que dorme na rua
é possível tirar poesia?
a comida acabou
a noite esfriou
a festa nunca começa
é possível cobertor tão grande para toda gente
é possível cobrir os pés da poesia
sem descobrir a cabeça?
e agora
a garrafa acabou
uma última gota
no meio do labirinto escuro
até as orelhas me cubro
escorro no salão de espelhos escusos
a festa nunca começa
a comida esfriou
a garrafa virou
zé
a poesia acabou
Quase chão
André Dia(s/z)?
Lá está
ele,
caído no meio-fio,
quase concreto,
quase chão.
Preta é sua cor
de sujeira
por cima
da cor negra
de luta.
Vida dura,
de miséria
de pele escura,
diferente
da vida bem nascida
que anda
de cabeça erguida
passando por cima
dele,
quase chão.
O SERTÃO VAI VIRAR SÃO PAULO E SÃO PAULO VAI VIRAR SERTÃO
Dias SECOS))) SECOS))) SECOS))))))
Ar SECO))) SECO))) SECO)))))
Povo SECO))) SECO))) SECO)))
Olhar SECO))) SECO))) SECO)))))
Lábios SECOS))) SECOS))) SECOS)))
Boca SECA SECA SECA
Garganta SECA SECA SECA
E eu reverberando)))) poesias de concreto...
)))))))))))))) ((((((((((((
Caranguejúnior
coisas que não existem
Essa estranha aventura traduzida por 3 Poetas do Tietê:
Visão poética
Marcelo Tadeu
Eu vejo nos olhos
eu vejo nas águas
e vejo no ar.
Não tenho poderes
apenas sou poeta,
não enxergo com olhos,
e tudo o que vejo
escrevo.
O barulho
André Dias(s/z)?
O barulho
que passa,
pego no ar,
barulho das máquinas
dos homens,
barulho-homens-máquinas
me impedem de pensar,
quero rir
quero chorar
quero ir embora
quero almoçar.
Meu corpo se desfaz
em fumaça
misturada
com o barulho no ar,
nada para dizer,
muito para poetar.
Rede de caçar borboletas
Paulo D'Auria
no ar passarinho vento
sinal do celular da televisão via satélite
no ar 15 folhas de outono cheiro de esgoto
azul
e os pensamentos todos do mundo misturados
e o poeta pescando
poeta antena parabólica
poeta com sua rede de caçar
borboletas e furacões
no ar o menino e a pipa
a pipa leva o menino
pela linha que a prende
ao chão
às mãos
do menino que fica
e vai
cataventos birutas barômetros
metereologistas astrônomos astrólogos
o poeta são todos
e não é
nenhum
o poeta e o mundo
fotomontagem de Paulo D'Auria
Poetas nem sempre se relacionam bem com a realidade concreta. Abaixo, dois Poetas do Tietê falam de sua relação com o mundo.
Dias de argila
André Dia(s/z)?
Ando
a esmo,
esperando
minha
hora,
poetando
inconsistência
de viver
dias feitos
de argila,
que quando
tijolos
caem sobre
os sonhos
que não
cessam de
existir,
pois não são
materiais.
É isso,
felicidade
não existe,
não pode ser
tocada,
medida,
catalogada,
só sonhada
eternamente,
então,
o poeta é feliz,
só que chora
por viver
num mundo
que não é seu.
Cerejas fora de época
Paulo D'Auria
o mundo é apenas um lugar
onde erro meus passos
de pé de chinelo qualquer
em quem o tempo testa seus dissabores
as certezas são cerejas fora de época
as verdades são vaidades amadurecidas demais
sinto o vento da primavera mesmo no auge
do inverno
a neve é um cobertor
que derrete
se faço versos
estou do avesso
quando me fecho
fico prosa
não olhe agora
estou nu
não acho a rima certa
para vida
a língua que nóis fala
por Caranguejúnior
O que tu fala
O que nóis fala, mano!
Oxe!!
É cumbia
É rock
É samba
Sem frescura
Do povão
Da cultura
Aimi nóti dógui nôul!
Soul Brazuca
Dou daqui
De Língua Solta
Da língua nossa
por Paulo D'Auria
minha identidade tem uma foto de passaporte
e outra de viagem
uma rima rica e outra pobre
uma prima bonita e outra má-o-meno
uma rima branca para um poema negro
branco e escravo no estômago tupi
eu lhe amo
amo você
e amo ela ela ela
pára-raios de antena parabólica
estrambólica
eólica
cólica verbal
Visões de Pasárgada
Todo poeta tem sua Pasárgada
por Paulo D'Auria
Todo poeta tem sua Pasárgada,
algumas têm amigos de verdade
outras têm sol a vontade
mas todas
tem prostitutas bonitas.
A prostituta, essa namorada natural dos poetas
a prostituta, que qualquer um pode ter
mas amar, amá-la, só os poetas sabem:
Amá-la inconsequente, amá-la na bebedeira
amá-la completamente, amá-la num poema;
o poeta, esse marido mítico das prostitutas.
Todo poeta tem sua Pasárgada,
algumas têm praias
outras têm rios
e todos nadam a largas braçadas,
tornam-se atletas, se esquecem de ser poetas!
Glórias, honrarias literárias podem esperar,
que sejam póstumas!
Pra já, - em Pasárgada, São Paulo
Sarajevo, Oslo – o poeta só almeja
o gozo.
Outra Pasárgada
por André Dia(s/z)?
Vim embora
De Pasárgada,
Lá nada encontrei
Que me interessava,
Paraíso de outro
Poeta,
Eu quero meu
Próprio paraíso,
Nada de exercícios
Pois sou preguiçoso
Quero dormir até
Meio dia,
Acordar com alguém
Diferente todo dia,
Lá não existem roupas
A criada se inclina
Com seus peitos grandes
Com meu desjejum,
Diante de minha cama
Há uma fila que não
Termina,
Todos vêm me acariciar
Com as mãos depois com a boca,
Eu sou o mais lindo
O mais desejado
E meu paraíso é ver
A volúpia de cada um
Diante de rei tão adorado!
Terra de Maria
por Marcelo Tadeu
Quando me encontrar no vazio
Quando me encontrar perdido
É pra lá que eu vou
Na Terra de Maria
Tudo faz sentido
Quando não souber quem sou
Quando me sentir ninguém
É pra lá que eu vou
Na Terra de Maria
Eu sou Rei
Sou Egoísta
E o caminho
Não Revelarei
Já que Maria
É só minha.
a história das flores
Sim, eu vou à zona de fraque
levo flores à puta
e isso é da minha conta
Sim, eu vou à Roma de boca
roubo frutas no parque
e engulo a vida a goles de vinho
Sim, eu caio de boca na vida
apalpo frutas na feira
e, estando em Roma,
quero que o Papa se dane,
eu vou à zona
Sim, sim, sim
devoro a puta a talagadas soltas
e me embriago nos domingos no parque
apalpo a polpa da freira
e aplaudo o apupo,
eu roubo a vida no tapa
se for preciso
Mas viver não é preciso
é falta
de juízo
e fim.
O Jogo
O Jogo
por Marcelo Tadeu :
A raiva, o grito, o revide, a violência
Sentimentos de quem já imagina
Que vai perder.
A calma, a paciência, o deboche
Sentimentos de quem já imagina
Que vai vencer
Acabou...
O Jogo
Por André Dia(s/z)?:
Me segurei... Tive vontade de chorar, mas estava cercado de pessoas... Essas pessoas que gritaram, que vibraram enquanto me mantive em silêncio durante os 90 minutos de jogo... E que depois, após a seleção ser desclassificada, só disseram palavrões. Mas eu não disse nada, só segurei a emoção.
Eu... Que não sou nenhum grande fã de futebol... Que realmente não entendo porra nenhuma! Tá certo, eu entendo quando é falta... Quando é gol, só isso.
E também entendo de segurar uma chance de ser feliz, mesmo que por poucos instantes, todo mundo torcendo pro mesmo time, sem rivalidades, todos irmãos vestidos de verde e amarelo... Até o dia seguinte e o sonho acabar...
O Jogo
Por Paulo D’Auria:
Não gosto de botar a culpa pelas derrotas em uma pessoa só. Sei que muita gente vai crucificar o Felipe Melo, muita gente vai meter a boca no Dunga, mas prefiro acreditar que quando um time com 11 jogadores perde, a culpa deve ser dividida por 11.
Aliás, antes de tudo, a culpa é de quem ganhou: a culpa do Brasil perder é da Holanda que ganhou!
Quando botamos a culpa neste ou naquele jogador, estamos egoisticamente desclassificando uma vitória merecida e suada do outro time, como se o nosso time merecesse a vitória de antemão e os outros fizessem apenas figuração.
Mas que o Brasil fez um primeiro tempo arrasador, que parecia que ia ganhar de 3, 4, 5, isso parecia. Mas depois, bastou um golzinho contra, uma jogada de escanteio magnificamente bem ensaiada pela Holanda, e pronto: o Brasil desmoronou.
O país do futebol alegre começou a apelar para a violência, esqueceram que futebol se joga com a bola e queriam jogar só com a chuteira...
Bom, nos vemos em 2014, quando o menininho que chorou no Vale do Anhangabaú, o menininho que chorou na praia de Copacabana, em Salvador, em Campo Grande, em Rio Branco, quando os 200 milhões de brasileiros menininhos terão a oportunidade de sorrir novamente.
Ou chorar, resgatando a sina de povo fadado à tristeza, quem não se lembra de 1950?... E que não venha o Uruguai!
ROLÊ
E fiz uma prece pra
SANTO AMARO
SANTA CECÍLIA
SANTO ANDRÉ
São Nunca
Que nunca me falte
SAÚDE ou SOCORRO
Desço a praça da SÉ
Em direção ao Sul
JAGUARÉ
Ou SUMARÉ
Já me encontro perdido
Em PERDIZES
Entre vários achados
Na VILA MARIA
MARIANA nem GUILHERME
Encontrei na VILA MADALENA
Me distraio com a
BELA VISTA
Da CACHOEIRINHA
E do CAMPO BELO
Do Alto da CASA VERDE
Vejo as motos
Mergulhando nas avenidas
Uns CARRÃO
E TATUAPÉ
De longe as buzinas
Incessantes
E daí se?
ITAIM BIBI, fofom, poooooommmmmm
Kabbuuummm...
Mais adiante
Respiro o ar quase puro
Debaixo de PINHEIROS cinzas
E fumaça preta
Na Marginal
Passa Fusca
Fiat uno
SANTANA
Passam trabalhadores
Acelerados...acelerando
A parada é dura
PARADA INGLESA
A barra é pesada
Na BARRA FUUUNDAAA
As seis da tarde
Quantos indo em direção
A LUZ
De certo que o PARAÍSO
É meio longe
E os Inferninhos lá na RUA AUGUSTA
Já pisei na CIDADE JARDIM
Arranquei uma flor
Do JARDIM IRENE
E plantei no JARDIM ÂNGELA
Para as mulheres guerreiras...
No JABAQUARA
Enchi a cara
Senti a falsa LIBERDADE
Fluir na cabeça
Copos de CONSOLAÇÃO
E um grito de IPIRANGA
De esperança...
Já deu minha hora
Vou embora pra BARUERI
O dia amanhecendo
E eu no TUCURUVI
Semana que vem
Novo rolê
Por aí...
Nessa louca REPÚBLICA
Caranguejúnior
POESIA ?NT?RR?G?Ç?O ( Sobre SP - II )
PRAGAS URBANAS
Vejo carros enfurecidos
Dedo médio levantado
Ouço palavras sujas como o céu
Vejo o ar...
Vejo motos
E morte
Costurando seus túmulos
Mergulhando na sorte
Vejo Pessoas
Estressadas
Enterradas
Entre paredes de concreto e aço
Caranguejúnior
http://poesiadedaremdoido.blogspot.com/
ADUM <---
Vida
Muda
Como
Uma
Muda
Sempre
Fala...
A
Muda
Muda
Como
Uma
Vida
Sempre
Muda...
A
Muda
Fala
Com
A
Vida
Maisavidanãoouve
Sempre
Surda...
Caranguejúnior
Lixo/Poesia - o que é rio? o que é peixe?
ROGERIO SANTOS
cato cacos de poesia
como quem garimpa
palavras perdidas
num dicionário da vida
acaso forro aflore
na Ilha das Flores
um eu expectador
personagem ou diretor
invoco terços vocábulos
verso tríade incesto
os Zés e meus eus
entre pilhas de dejeto
masco nós e cós e cuspo
como pet e pão e domo
minha terra prometida
meu maná estilhaçado
devoro por essa vida
tanto tudo todo todo
remo e rede e barco
e esse peixe multiplicado
que todo peixe é palavra
um feixe no xis da questão
aquele que nada e se cala
é peixe de um novo Sião
Haiquasis - Papoetaria 13/03
Papoetaria 2010
Abaixo, o resultado de nossos primeiros exercícios:
André Dia(s/z)?
Na minha frente,
Mesas vazias,
Os poucos rostos,
Também vazios,
Meu copo vazio.
Só as estrelas
No céu,
Estão cheias,
Cheias de esperança
No amor
Ou algo além,
Ou simplesmente
Inspiração
Para escrever
Uns versinhos
Para meu bem.
Glamour
Paulo D'Auria
Enquadrados no centro da fotografia os casais,
as mulheres, os passantes,
as luzes,
as luzes da cidade ardendo no centro da fotografia.
Mas as sobras aqui
e ali, nos cantos
venezianas entreabertas, vazias,
mesas vazias,
moleques de recados vazios;
galhos de uma árvore flutuando no canto,
o tronco fora
da fotografia.
Sobras sombras sem forma de fora
do centro ardente
da fotografia.
A Estação de Saint-Lazare, de C. Monet
O Último Trem
André Dia(s/z)?
Na estação
Eles vêm e vão,
Numa busca
incessante,
Corações de manteiga
e pedra,
Mergulhados no
ferro e a fumaça,
Espíritos macambúzios
presos na carne,
Aguardando o
último trem,
Rumo à estação
Paraíso
Fumaça azul
Paulo D'Auria
No céu sem cor
a fumaça é azul
a fumaça da locomotiva
Na estação sem cor
idas e vindas cinzas
e vidas
a fumaça é azul
A fumaça da locomotiva
sozinha alheia aos anseios
e passeios dos corações
em casacões marrons
Sozinha cumprindo o seu destinos nos trilhos
derramando a tinta azul de sua fumaça
nas telas
sem vida
No teatro do Tendal, bem ao lado de onde escrevíamos nossos exercícios, o Coral do Tendal da Lapa fazia uma apresentação e, claro, inspirou-nos.
A Chuva
André Dia(s/z)?
Um canto
Melancólico
Me chega aos ouvidos,
Anjos de negro
Anunciam o fim,
A chuva cai
Forte,
Varrendo de meus
Pensamentos
O que já se foi,
Nas colunas
De pedra
Deixo inscrito
O lamento
Do último poeta
A crer num
Mundo de ilusão.
Coro
Paulo D'Auria
A música dos coros sempre me fala ao coração, mas não é um diálogo. Não pede licença, não bate na porta.
Invade.
A música dos coros com suas mil vozes profundas não entra pelos meus ouvidos, envolve feito jibóia meu coração, extraindo minhas emoções por esmagamento.
A música dos coros sempre me faz chorar, porque dói.
PS: Estou nas cochias do teatro, de repente o elenco do coral invade os bastidores para a troca de figurinos. A moça de preto veste um espartilho vermelho acendendo em mim as emoções mais básicas do ser humano, as emoções com cores, resgatando-me do poço escuro para onde já me arrastava a música dos coros.
Papoetaria, todos os sábados das 11h00 às 13h00 no Tendal da Lapa, Rua Constança, 72.
Alegria!
É batucada! É carnaval!
Mas, que louco resistiria?
É coisa de brasileiro, afinal!
Muita gente vai encher a cara
e se matar nas estradas,
Vai tentar pegar mulher na marra,
Haverão muitas barrigas inchadas!
Haverá aumento de natalidade,
e do índice de infectados por HIV,
De tamanha alegria, mortalidade
com tanta estupidez, homem sempre à mercê
Dos piores resultados,
Colhendo da inconsequente plantação
Eu te amo, São Paulo!
sujar a paisagem,
Marginais correm
ante o som vibrante
da sirene,
Homens-cinza como
os prédios que me envolvem,
cospem das mãos, rajadas de fogo,
Vermelho tinge o quadro,
Antes sem cor, frio, impenetrável
como o semblante
do vendedor de bilhetes
de loteria,
Vindo de meu querido
Bixiga ! Ô, meu!
Macarronada com porpeta!
Eu te amo, São Paulo!
Mas, quem vai livrá-la
da escória?
Na Av. Paulista,
me refugio no metrô,
Luta entre gangues
ou torcidas?
Dá no mesmo!
Eu te amo, São Paulo!
Só espero pela ultima chuva,
Decisiva,
Que irá limpá-la
de vez,
E poderei andar de novo,
Solitário, na minha terra da garoa querida!
saudosismo
Recentemente, comentando uma postagem minha, Luiz Pagano, do Capivara Paulistana, sugeriu, “Podiam proibir também a entrada das tempestades, permitindo apenas a volta da garoa à cidade.”
“Ê, São Paulo, São Paulo terra boa!” A sugestão marejou meus olhos. Confesso, sou saudosista.
Saudosista dos trilhos de bonde que por longo tempo resistiram inúteis em meio aos paralelepípedos da cidade – depois, cobriram tudo com asfato. Menino, íamos visitar uma tia que morava no Ipiranga, e eu freqüentemente me perdia em voltas neste bonde de imaginação.
Saudosista dos litros de leite entregues de madrugada à porta das padarias ainda fechadas. Ninguém mexia. Certa vez, vindos da balada, eu e meus amigos bebemos um. No dia seguinte, a padaria aberta, fomos pagar.
Saudosista da garoa, a última a partir. Morreu devagarinho, cada vez molhava menos.
Passei a última noite de garoa da cidade aos beijos na pracinha perto de casa com uma namoradinha da oitava série. Ah, fosse vivo, Adoniran tirava um samba desta noite.
Vou proibir São Paulo desta besteira de “vocação para o trabalho”, vou proibir São Paulo de crescer. Quero de volta aquela inocência, aquele espírito caipira sem o qual o paulistano nunca mais vai ser feliz!
CARDÍACOTIDIANO
Marcapasso
Meus cambaleantes passos
Sobre esse chão
Sujo e àspero
Marca meus passos
Sobre essa ponte
De safena, de Helena
De Maria e José
Marca
Cada pisada do meu pé
Marcapasso
Cada Suspiro meu
Nesse quase puro Ar
Marca até quando eu espirrar
Marca meu caminho
Sobre essa
Avenida ferida
Perdida
Marcapasso
Quantos carros
Quantas motos
Quantas mortes...
Marcapasso
Quanto tempo
Quantas horas
Para o busão passar
Marcapasso
Quantos moleques
Engolem fogo no semáforo
E quantos engolem mágoas
Marca
Quantos limpam parábrisas
Quantos enxugam lágrimas
Marcapasso
A placa daquele carro
Que jogou água em mim
No dia da enchente
Oxente, Enchente?
Marcapasso
O sorriso dessa gente
O choro dos Indigentes
Marcapasso
A minha tensão
A minha hipertensão
Marca uma solução
Para este cardíacotidiano
Marcapasso
Minhas idas
Minhas vindas
Minha vida...
Caranguejúnior