em branco

Confissões de um (palhaço) apaixonado

Olá, criançadaaaa!!!
Vocês estão rindo da
minha cara, né?
Vocês já tiveram
uma cara assim!
Se não tiveram,
ainda vão ter!
É cara de quem tá amandooo!!
E eu vou dizer pra vocês
o que é que estou sentindo!
Por mais
que a queda
seja terrivel,
Sim! Eu quero escalar
essa montanha de algodão doce!
Me agarrar a esses cabelos!
Inventar apelidinhos ridículos:
"Cadê a bizuquinha do fofucho?
Cadê? Não! Desliga, você! Não! Você!"
Ver o sutiã dela,
pendurado no chuveiro!
Ver o cocô dela,
no fundo do vaso!
No fim, compartilhar
a mesma escova de dentes,
Por mais estupido
e anti-higiênico
que seja,
Afinal
Quem ama,
Divide até as mesmas bactériaaas!!!

e morreram tristes agora


Quando eu era menina, achava domingos de sol e as pessoas passeando de bicicleta no parque, a coisa mais bonita do mundo. Meu pai levava a bicicleta amarrada no capô do fusca. Chegando ao parque, parafusava as rodinhas e eu estava pronta pra ser feliz.

Quando eu era menino, folheando as revistas de costura de minha mãe, ia direto para os vestidos de noiva. Achava noiva a coisa mais bonita do mundo. Grinaldas, bouquet...

Quando eu era menina, Odiava as histórias que acabavam assim: “E viveram felizes para sempre.” Como assim? Para sempre é muito longe, é quase nunca!
Quer ver? Qual seria exatamente o contrário disso? Seria começar uma história assim, “E morreram tristes agora!” Não é? “E morreram tristes agora...” Ninguém começa uma história assim. Então por que terminar com “E viveram felizes para sempre?”
Alguém está boicotando o final dessas histórias... Estão me escondendo alguma coisa!

Quando eu era menino, ainda não entendia essa história de mulher da minha vida, mas já sabia que queria casar. Com quem, porquê, quando e onde eram questões que sequer passavam pela minha cabecinha. Eu apenas sabia que uma linda mulher toda de branco me esperava no futuro.

Quando eu era menina, não pensava em casar. Pensava em morar sozinha na Paulista, no máximo dividir apartamento com uma amiga. Trabalhar, ser independente.

O engraçado é que foi ela quem falou em casamento a primeira vez. Assim, no meio de uma conversa, naturalmente, “quando a gente se casar...” E eu, que sempre pensara nisso, levei um susto!

Saiu. Quando eu vi o espanto tava todo lá, estampado na cara dele. Quase me arrependi, mas falei por falar, sem perceber. Estes pensamentos viviam na minha cabeça ultimamente: a nossa casa, os móveis, as cortinas. Planos.

Por que eu, que sempre pensara nisso, tinha ficado assustado? Para onde tinham ido os vestidos todos, as mulheres de branco sonhadas em menino? Por que nunca pensara nela assim, se era evidente que era ela, - a mulher da minha vida?Sorri forçado, mas ela percebeu o meu desconforto.

Intuía que ele não teria medo do meu sucesso, como dizem que os homens têm das mulheres. Não ia desistir da faculdade, não ia desistir de nada. De nenhuma das bicicletas da vida.
Apenas acho que ninguém parafusaria as rodinhas no parque para nossos filhos melhor do que ele.

Percebendo que ela percebera que eu percebi que ela percebera... Recolhi o sorriso amarelo e continuei a conversa do ponto crítico em que ficara emudecido uma longa fração de segundos atrás: “Quando a gente se casar...”

- A conversa fluiu sem dor a partir desta descoberta simples: naquele momento eu deixara de ser menina.
- A conversa fluiu sem dor a partir desta descoberta simples: naquele momento eu deixara de ser menino.

volta da frança


Não, eu não era discreta.
Provocava-o nua,
dançando piruetas de moleca
na janela de frente pra sua.

Mal sabia eu que
enquanto minha cabeça ia pelo mundo da rua
você planejava o evento.
Pensava eu em bicicleta,
apareceu falando em sacramento.
Imaginem vocês o meu desalento...

Veja bem, meu bem
como isso me afeta:
arquiteto ser arquiteta!
Filhos, quilos, dieta...
Fui logo tirando meu da reta!

Mas era teimoso o elemento,
proposta ereta
me perseguia com fôlego de sargento!
Fácil, não desistiria de seu intento.

Começamos a namorar,
eu ainda analfabeta
nas armadilhas do amor,
pensando: desiste no primeiro tento.

Qual o quê!
Com aquela cara de sonso,
arrastou-me o sujeito para o leito,
primeira etapa de seus planos.

Hoje fazemos anos,
bodas comemoramos!
Trocamos aliança,
na Volta da França!

TERCEIRA CARTA

(por Ferrari)

Joana passou duas semanas chorando. Uma voz ecoava em seus ouvidos feito papagaio: “homem é tudo igual”. Rita, sua amiga de pensão, que havia passado por situação parecida, tentou consolar a infeliz. Pegou um baralho que havia sobre a mesa e virou um valete de copas.

— Doença no coração! — disse Rita.

Não precisava nem falar. Desde o sumiço do namorado, um fantasma perseguia Joana, um azedo lhe maltratava o coração. Rita tirou uma segunda carta. Era uma dama de paus.

— Suicídio! — disse Rita.

Joana sentiu um tranco. Aquelas semanas tinham se transformado mesmo num suicídio. Estava viva por fora, mas morrendo por dentro. Rita puxou uma terceira carta. Abriu espaço entre as duas anteriores e a colocou no meio, velada.

— A vida, Joana, é uma porta — disse Rita, que jogou uma brilhantina dourada sobre Joana e completou — Quem irá lhe mostrar a terceira carta é ela.

“Ela quem? A morte!”, pensou Joana.

Algum tempo depois, sozinha em seu quarto, Joana começou a andar de um lado pro outro. A solidão havia se tornado um zagueiro implacável. Não sabia como driblá-la. Ficar sem nenhuma presença ao alcance era como aproximar a alma de um aspirador. Além do seu próprio pulsar, Joana precisava de outros. Entrou no quarto de Rita e acendeu a luz. Deu de cara com uma vitrola. Movendo-se em silêncio, foi até a pilha de discos e pegou um, ao acaso. A capa do disco estava tão empoeirada que o cantor da foto mal conseguia respirar. Joana tirou o disco da capa, deitou-o sobre a cama giratória e soltou a agulha bailarina sobre o vinil. Ficou esperando o desabrochar do som como quem aguarda o nascer do sol. Então, naqueles breves segundos de ruído, enquanto a agulha deslizava sobre o pátio negro, prestes a alcançar o universo musical, fechou os olhos e vagou no breu.

“Eu te amo”, disse a primeira estrofe da música. Sobre a penteadeira, entre o valete de copas e a dama de paus, um curinga.

aulas de bicicleta


Por que eu preciso de você? Por quê?
Você diz que me ama, que é para sempre, intenso, eterno, tudo superlativamente!, e que, sem mim, seria o fim...
Mas isso deveria ser eu a lhe dizer:
- Sem mim, seria o fim!
Eu tenho amor próprio, não preciso de outrem a me completar.
Você não mudou a minha vida, eu já era feliz ou triste antes de te conhecer. E assim pretendo continuar: inteiro, com meus erros e acertos.
E agora você aparece e fala em casamento?
Essa experiência não tem dado certo ao longo da História.
Não deu certo para os meus pais e nem para os pais deles, não deu certo com ninguém que eu conheça. Por que daria certo com você? Por quê?

Porque eu preciso de você:
Porque você não se parece com ninguém que eu conheça. É engraçado, mas, com você, casamento, esse erro contumaz, parece que poderia sim, dar certo.
Porque ao seu lado para sempre é um fim de semana; eternamente é leve.
Porque com você eu não me sinto inseguro em me soltar ladeira abaixo!
Porque antes você me ensinou a me equilibrar, a pedalar.
Porque você me ensinou a andar de bicicleta!

lindabelle sabia que era amor


"Roda de Bicicleta", de Marcel Duchamp

Lindabelle sabia que era amor. Morava na pensão há três anos, desde que arrumara este emprego de caixa no supermercado e trancara a faculdade. Pensão-supermercado-faculdade trancada, esses três elementos eram o símbolo de sua liberdade. Um descontentamento qualquer, porém, a incomodava.

Lindabelle sabia que era amor. Quando saiu de casa, batendo pé, fechando a cara, pensara, “Eu volto! Eu volto realizada e esfrego na cara deles!” Mas nada acontecera. Também, não planejara nada. Planejara apenas ser feliz. E tinha sido feliz. Um descontentamento qualquer, porém, a incomodava.

Instintivamente sabia há muito tempo o que sempre quis da vida. Por isso saiu de casa, por isso trancou a faculdade, por isso o descontentamento. Queria ser esposa.
Nesse meio tempo Entregara-se à meia-dúzia de homens de praxe que os seus vinte cinco anos comportavam. Mas, agora, Lindabelle sabia, era amor!

Conheceu Erisson na academia, na aula de Power-bike, trocaram olhares por duas semanas e logo estavam namorando.
Erisson, dois anos mais novo que ela, dirigia um carro 1.0 que o pai lhe deu de presente por entrar em Administração de Empresas. Assim como ela, não fazia planos.

Não fazia planos, eu disse? Do dia para a noite Lindabelle descobriu-se planejando seu casamento. As tantas dúzias de margaridas, o buquet de flores do campo, o vestido assim-assado.
Os novos planos não passavam de uma reedição do velho sonho engavetado de sua vida. E não precisava mais se envergonhar, porque agora, ah!, agora era amor!

Da casa dos pais para a pensão só levara 3 coisas: uma mala de roupas, sua Caloi-Ceci, e a coleção de Revistas “Noiva”. Mais de 100 exemplares cuidadosamente conservados.
A coleção nunca deixou de crescer, na medida de um exemplar por mês. As roupas da velha mala, já trocara todas. A bicicleta não usou nunca mais.

Nunca mais até o domingo em que Erisson inventou de ir pra Santos. Quatro sanduíches de presunto no pão integral, duas Cocas e seis latinhas de cerveja na geladeira de isopor, e a bicicleta dobrada no porta-malas.
Do alto da serra, Lindabelle pode ver o mar se esparramando no mundo. A manhã azul, azul. Suspirou-se toda por dentro e deitou no ombro direito de Erisson.

Na areia, os sanduíches rodando no estômago recheado de cerveja, Erisson sentia-se completamente satisfeito enquanto Lindabelle tentava se reequilibrar na velha bicicleta, “Nunca mais se esquece, uma ova!”

Fosse amor ou não fosse, casamento ou estatística, olhando o Erisson arrotar sua plenitude, Lindabelle percebeu que o descontentamento nunca mais abandonaria sua vida, porque a vida simplesmente escapara de suas mãos.

Deu três pedaladas sem cair, sorriu, embalou. O vento no rosto desanuviou os pensamentos turvos, e, por um instante perfeito, sem passado e sem futuro, Lindabelle foi absoluta e plenamente feliz.
Como só quem reaprende a andar pode ser.

feia da lotação















(por Ferrari)

coitada!
coitada porque?
porque o queixo é alpinista
porque não serve pra recepcionista
porque chora assistindo novela
coitada!

coitada porque?
porque o ombro pede esmola
porque tem coragem
tem direito
mas não tem peito
coitada!

coitada porque?
porque o cabelo é ruim
a unha é ruim
o pé é o fim
fede e cheira
a bunda não cabe na cadeira
a barriga, na calça apertada
coitada!

coitada porque?
porque quase tem gogó
quase tem pinto
o bigode é descolorido
a perna é barbeada
oh dó!
coitada!

coitada porque?
porque sabe sorrir
porque gosta do cobrador
porque vai a igreja aos domingos
porque mora no paraíso
porque desceu na consolação
porque deseja ser amada
coitada!

o casamento da magrela


Sr. Solto Eiro na Vida, aceita a Srta. Caloi Monark Magrela como sua aventureira companheira, para amá-la e pedalá-la (lá-lá, lá, lá-lá-lá Hey jude, dont make it bad / Take a sad song and make it better), na saúde e na ferrugem, até que o seu casamento com uma garota de carne e osso os separe, pendurando capacete e joelheira, esquecendo-a no fundo da garagem, criando barriga, filhos e futuro?

entre o altar e o selim


A bicicleta é poesia, é vento batendo no rosto de frente para os caminhos do mundo.

Já o casamento...
Os poetas cantam o amor, mas nunca o casamento.
- Quantos bons poemas você conhece sobre o casamento?
E viveram felizes para sempre nunca dá conta da louça na pia, da roupa suja, sogra, filhos.

Ainda assim, a maioria dos apaixonados tem preferido o altar ao selim, a aliança ao guidão.
E isso não se deve apenas ao inexplicável coração, mas é também uma questão de equilíbrio.

Para andar de bicicleta é preciso aprender a se equilibrar sobre duas rodas. Já no casamento é preciso aprender a se equilibrar na vida.

A dois fica muito mais fácil aprender esta lição.

ele disse, ela disse

Fiz uma lista de prós e contras,
deu bicicleta de goleada:
casamento, justificar meus passos
bicicleta, livrar-se do trânsito
casamento, engordar
bicicleta, entrar em forma
casamento, só pra começar, pagar a festa
bicicleta, baixa manutenção
...Alguém explica o amor?

Fiz uma lista de prós e contras,
bicicleta ganhou disparada:
casamento, estrias
bicicleta, pernas firmes
casamento, futebol de domingo
bicicleta, passeio no parque
casamento, filhos, casa & trabalho
bicicleta, novos amigos
...É preciso explicar o amor?

quando nos casamos

Quando nos casamos, uma bicicleta não resolveria nosso problema. Nem um fusca 73 estava mais resolvendo.

Tínhamos esta necessidade de estar juntos que só os apaixonados entendem. E não era só pra fazer sacanagem não, Sr. Mente Suja! Precisávamos conversar, compartilhar o dia, acertar os ponteiros do mundo.

E essas longas digressões já naquela época começavam a ficar perigosas tarde da noite num fusquinha, e a atrapalhar o sono de nossos solteiros companheiros de quarto.
A bicicleta viria a seu tempo, mas então era tempo de casamento.

Casa não tínhamos, dinheiro muito menos. Mas, somando nossas vontades, nossos amigos e a gravata do noivo, até uma lua-de-mel nós tivemos.
E fomos andar de bicicleta na lua, na lua-de-mel, nas ruas da lua.

Muito tempo depois, nossa volta mais longa, queríamos ver um moinho, e os dois Dom Quixotes, cada qual Sancho Pança do outro, alugamos uma bicicleta em Bruges, Bélgica, e pedalamos, pedalamos, pedalamos até encontrar nosso moinho de vento.

O tempo das bicicletas havia chegado e parecia que iria durar para sempre!
Mas furaram-se os pneus, enferrujaram-se os aros, rodou o moinho dos tempos.

Nós dois seguimos em frente, hoje de patinete, amanhã de rolimã, depois, quem sabe?
Palhaços do circo do mundo, enquanto houver esta lona azul de sol e estrelas, até na corda-bamba nós vamos!

MAIO... CASO OU COMPRO UMA BICICLETA?



Maio, mês das noivas... Ah, love is in the air... E os Poetas do Tietê atracam com o tema: "Caso ou compro uma bicicleta?"



Tema que será desenvolvido também na Papoetaria, nossa oficina de criação literária, todos os sábado das 11:00 às 13:00 (a partir de 9/5) no Tendal da Lapa.