por Ferrari
A vizinha levou um vinho e um panetone.
A mesa estava posta no quintal, repleta, iluminada, próxima ao chafariz que, segundo Eliseu, só não bombeava melhor que seu coração. Feito pombos, os convidados pulavam de travessa em travessa. Na parede, uma imagem de São Epitáfio zelava pela moral e bons costumes, mas com a conversa variada, o santo parecia perdido. A festa era a última parcela da dívida que Eliseu tinha com São Epitáfio. Entre outras coisas, ele havia prometido ao santo a inauguração de um chafariz na virada do ano, caso sobrevivesse a operação cardíaca.
De repente, o quintal escureceu. O filho da vizinha subiu na laje da casa e viu que o bairro inteiro estava apagado. Eliseu ligou pra companhia de luz. A equipe de manutenção já estava a caminho.
Faltavam poucos minutos pro ano-novo, quando o caminhão da Força e Luz parou diante da casa. Via-se apenas um vulto em cima do poste. Na festa: uva passa, uva passa, uva passa… Alguém ligou um radinho de pilha numa estação evangélica. O pastor dizia: “Vamos dar as mãos e fazer uma corrente pra entrada do ano. Se você estiver sozinho, levante suas mãos pro céu; estaremos todos juntos”. Na espera de um milagre extra e gratuito, Eliseu ligou a chave do chafariz e pôs a imagem de São Epitáfio ao lado do interruptor. Depois chamou todos pra darem as mãos ao redor do chafariz. Em poucos minutos, a corrente de fé estava formada – só faltava a corrente elétrica.“Treze segundos”, disse o pastor no rádio. “Oito… três… dois… um…”.
No poste, o vulto se transformou na equipe de manutenção – um homem só, ou melhor, um só homem – pois também estava com as mãos levantadas.
“Aleluia!”, disse o chafariz.
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